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sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Os militares e o país que servem

Evocando diferentes razões, os militares reclamam pelos maus tratos a que, afirmam, são sujeitos.

Têm sobejos motivos para assim proceder quando se assiste a um perverso entendimento de que, em paralelo com os severos deveres e restrições ao direito de cidadania que lhes são exigidos a troco da sua condição militar, vêem, em igual ou superior proporção, ser-lhes retirados direitos e impostos sacrifícios que, para além de violentamente fustigarem as suas condições de vida, atentam contra a sua dignidade insidiosamente posta em causa.

Salta à evidência que, quando reclamam pelo que lhes vai acontecendo, no seu lugar poderia estar um desempregado ou empregado, um pensionista ou trabalhador activo, um funcionário público ou quem o não é, empresários, jovens e idosos. Enfim, têm a noção de que assistem razões à generalidade da população para se sentir injustiçada pelos avassaladores sacrifícios que a todos penaliza e, com uma tal dimensão, que transforma em desgraçada naturalidade a forma como estatisticamente se tratam os que passam fome e os que, envergonhadamente, se escondem da pobreza a que os conduziram.

Estamos, pois, todos no mesmo barco. Mais parecendo nau que se vai afundando, não por umas quaisquer causas da natureza, mas antes assemelhando-se, utilizando uma imagem do passado, a um trágico episódio em que uma “quadrilha de piratas” dela tomou conta e não desiste enquanto a não afundar.

Há alturas em que, individual ou colectivamente, podemos ser confrontados com sacrifícios. Num e noutro caso manda a razão que lhes procuremos as causas para, da forma que melhor se adeque, encontrarmos a solução para ultrapassá-los. E é isso que, no mínimo, se exige que seja explicado para que, sujeitos do sacrifício, entendamos os caminhos que nos são propostos para os suportar.

Dir-nos-ão uns que são suficientemente clarificadas as soluções propostas, encarregando-se de acrescentar sobejas justificações para fundamentar o que a generalidade da população teima em não entender. Surgem outros, com o mesmo entendimento dos primeiros, aplaudindo igualmente o caminho escolhido, mas justificando o injustificável com o argumento de que as medidas aplicadas só pecam por insuficiência ou dificuldade de explicação. Numa sucessão de “explicadores” da área da governação sucedidos por um infindável corrupio de comentadores de diferentes matizes, mas todos eles, de uma ou de outra maneira, na busca do melhor fundamento que possa colher a aceitação dos seus destinatários.

Incansáveis, tudo fazem, os nossos governantes e mais alguns, para nos levar a compreender o que só “indiscutíveis sabedorias” conseguem alcançar. Dividindo e lançando todos contra todos, recorrendo à clássica estratégia de “dividir para reinar” e assim obter sucesso na aplicação de injustas e desequilibradas medidas, fazendo crer às partes “desavindas” a aparência de justa causa, quando a causa injusta é generalizada.

Algo de profundamente anormal se passa.

À excepção dos governantes, de uma troika que, naturalmente, cuida dos interesses que representa (os omnipresentes mercados…), nada coincidentes com os do País, e de uma parafernália de comentadores de serviço, ninguém compreende a utilidade dos remédios aplicados para uma suposta cura, quando os factos e a evidência demonstram que, a não ser alterada a prescrição, não tarda, o doente certamente sucumbirá perante o tratamento que lhe foi administrado.

Urge, pois, encontrar forma de ajudar os nossos incansáveis governantes a encontrar melhor maneira de convocar os cidadãos em geral e, naturalmente, os militares também, a entender e a mobilizarem-se para ultrapassar esta curva apertada da nossa vivência colectiva. Em uníssono preferencialmente, pois sacrifícios distribuídos por todos, incluindo os particulares responsáveis pelo estado a que foi conduzido o País, tornarão tudo bem mais fácil.

Em jeito de modesto contributo sugerimos, então, que se faça aquilo que logo de início, aquando do diagnóstico feito às depauperadas contas do País, devia ter sido feito, como método e séria postura perante todos nós como comunidade, em favor de uma necessária compreensão para o atoleiro da dívida a que a Nação foi conduzida:

"Desmultiplique-se a dívida pública e outras dívidas e explique-se-nos as suas origens, os seus responsáveis, como foram utilizados os dinheiros públicos e ao serviço de quem e tudo o mais que houver a aclarar e se considere necessário para português entender.

Recorrendo a cidadãos com provas de integridade e irrepreensível conduta, moral e eticamente exemplares, à prova de qualquer suspeita e não condicionados por quaisquer espécie de interesses que possam colidir com tal missão e que, outros, que não os governantes e correlativos (já nos deram sobejas provas de que não são confiáveis), ajuízem quem poderá reunir o adequado perfil para tão nobre encargo."

Estamos em crer, diríamos até, com um elevado grau de probabilidade, que se tornaria bem mais fácil convocar os portugueses para o altar dos sacrifícios que fossem requeridos, na certeza de que o seriam com diferente critério de justiça e equidade, pois mais facilmente se perceberia que as responsabilidades são, contra o que vem sendo afirmado, qualitativa e quantitativamente, bem diferentes.

E estamos em crer que os portugueses em geral, os militares e as Forças Armadas de Portugal, com funções de soberania no Estado que somos e na Pátria que se lhes exige, estejam prontos a defender, estariam dispensados de cortes a esmo fazendo perigar a paz social que todos desejamos e os alicerces de um Estado que pretendemos ao serviço de todos.

Coronel, presidente da Associação de Oficiais das Forças Armadas

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